A UTILIZAÇÃO DE SONHOS COMO ESTÍMULO PARA A COMPOSIÇÃO DE CENAS
Fabio de Almeida Pimenta (PROART/UEL),
Aguinaldo Moreira de Souza (Orientador), e-mail: fabio.fabio.fabio@hotmail.com
Universidade Estadual de
Londrina/Departamento de Música e Teatro
CECA - MUT
Artes – Teatro
Palavras-chave: Treinamento de ator, sonhos,
surrealismo
Resumo
O
objetivo desta pesquisa foi realizar um estudo teórico e prático que
investigasse possibilidades de utilização dos sonhos como estímulo para a
criação cênica. Este processo se desenrolou junto ao curso de Artes Cênicas da
Universidade Estadual de Londrina – UEL e ao treinamento diário proposto pelo
projeto de pesquisa treinamento técnico e sistematização de processos de trabalho de
ator coordenado por
Aguinaldo de Souza. O
cronograma da pesquisa incluiu períodos de registros de imagens e episódios que
possam ser resgatados dos possíveis sonhos do próprio artísta pesquisador.
Participação na composição da demonstração de trabalho “Sonhos” coordenada por
Margarida Vine em 2011 junto aos alunos do 2ºano de Artes Cênicas; e sessões de
trabalhos de dez horas semanais referentes: a pesquisa bibliográfica, estágios
de observação e relatórios sobre as atividades. Procurei concretizar registro
dos materiais, reflexões e práticas como
resultantes da pesquisa.
Introdução
Vasily Toporkov ao ser dirigido por
Stanislavski, escreve: “[...] hay que partir en primer término de sí mismo, de
sus cualidades personales; en segundo término, siguiendo la leyes creadoras; y
em el tercero, subordinando su próprio yo a la lógica de outra persona, [...]”
(TOPORKOV, 1961, p.170)
A partir desta colocação, considero
que todo papel representado por um ator será a soma da individualidade dele,
com as situações propostas pela representação.
Então, suponho que o ator tem a acrescentar, enquanto individualidade,
uma bagagem técnica e outra pessoal. Enquanto técnica, ele carregará para o
momento da cena tudo o quanto investigou, em teoria e prática. O ator é um ator
diferente de acordo com os princípios técnicos e conceitos teatrais que domina.
Quanto a bagagem pessoal tem-se, por exemplo, o seu contato com as diferentes
formas de arte. A apreciação destas pode agregar (à
complexidade do ator) uma carga de conhecimento que será refletida em seu
trabalho. Não se trata de
conhecimento técnico, são vivências significativas para o desenvolvimento do
artista. Há desenvolvimento proporcionado pela contemplação da música, das
artes plasticas e do teatro. Neste contexto, presumo que ao fazer
um registro pessoal de sonhos, um espaço é criado na memória e surgem
possibilidades criativas a partir da retomada deste material. A exemplo da
apreciação da arte, registrar os sonhos agregaria à pessoalidade do ator um
material que não seria agregado se não através desta ação. Pretende-se que este
material se torne
presente e, podendo ser relembrado, seja uma rica fonte de estímulos criação
cênica.
Materiais e métodos
Como
primeira etapa da pesquisa foi preciso agregar materiais referentes ao objeto
da pesquisa, ou seja, os sonhos. Para tal criou-se o costume de um diário de
sonhos. Este, recebia todas as manhãs, anotações sobre o que havia sido
vivenciado durante o sono. Tive como referência da utilização dos sonhos em
processos artísticos, o movimento Surrealista. Assim, outra ação desta primeira
etapa da pesquisa foi um levantamento bibliográfico, leitura e fichamento de
livros sobre o Surrealismo. Além disso foram realizadas sessões de uma
adaptação do jogo Cadavre Exquis, da qual também surgiram materiais. Acerca
das relações entre os sonhos e este movimento, cita-se Ceres Fernandes no livro
“Surrealismo e loucura”: “Freud já afirmava que o mundo onírico dos sonhos se
expressa de forma poética.” (FERNANDES, 2008, p.47). Através da mesma autora
sabe-se que os surrealistas se interessaram pelos sonhos como estímulo criativo
e não como material de significado psicanalítico. E ainda no mesmo o livro:
“[...] tanto Freud quanto Lacan, já afirmam que os sonhos se apresentam por si
sós como linguagem. Eles inclusive contém recursos semânticos e sintáticos tais
quais os da poesia […] bem como os poetas incluem racionalmente em suas
criações poéticas.” (FERNANDES, 2008, p.49 )
Já
no livro “SURREALISMO” de Marilda Vasconcelos encontra-se: “Cinema e sonho
exprimem através de imagens, o conteúdo latente da vida.” (VASCONCELOS, 1986,
p.27) e “No ato da criação, o poeta incorpora, simultaneamente, os
domínios do sonho do mágico e do maravilhoso. […] “todos são videntes” […] “o
Surrealismo está ao alcance de todos os inconscientes.” (VASCONCELOS, 1986,
p.42) A mesma autora ainda irá falar especificamente sobre a prática de anotar
os sonhos: “Outra prática surrealista é a anotação dos sonhos, logo ao
despertar. Todos nós sabemos que a teia das imagens se esgarça ao vislumbre da
lucidez, o que torna difícil sua transcrição. […]”(VASCONCELOS, 1986, p.47) E
ela complementa: “Cabe aos poetas operarem a síntese entre sonho e realidade e
essa síntese é tanto de ordem poética como prática.”(VASCONCELOS, 1986, p.47)
A
partir do diário de sonhos e da pesquisa em torno do Surrealismo, foi possível
traçar uma tabela com algumas características recorrentes nos sonhos
registrados e possíveis transposições para a cena.
Quando
foi realizado o trabalho coordenado por Margarida Vine este panorama já estava
estabelecido. Deste quadro foram tomados os princípios a serem investigados.
Pude aliar minha participação neste trabalho com a pesquisa de iniciação
artística. O título da demostração e a opção por trabalhar sobre este tema foi
uma conveniente coincidência. Duas cenas em especial foram objetos deste
estudo. A que iniciava a peça colocava uma fileira de atores andando de forma
organizada porém sinuosa. Era como se eles tivesse um caminho definido, mas não
tivessem controle de seus corpos. Nas duas laterais entram atores com tambores
tocando-os de forma irreal, não conseguindo atingi-los com as mão e
reproduzindo seu som com a boca. A outra cena traz a realização de uma
partitura improvisada simultaneamente a contação de sonhos aleatórios conforme eles vem à mente.
Nestes dois momentos da demonstração de trabalho foram propostas aplicações de
aspectos listados que refletem os estudo sobre o Surrealismo e sobre o registro
dos sonhos em um diário.
Resultados e Discussão
A
analise posterior desta pesquisa a coloca no mínimo como um processo
incompleto. Surgiram poucos resultados práticos específicamente a partir desta,
no entanto toda ela implementa a minha formação como ator. E mais restritamente
ela refletiu nos trabalhos realizados concomitantemente. Isso inclui a
demonstração de trabalho “Sonhos”, e o espetáculo “Viés” apresentado pela
CIA.L2. Nestes, sempre que possível o estudo dos sonhos era trazido para as
partituras corporais realizadas. Considero que é possível definir os sonhos
como um material rico para as Artes Cênicas. Um material pessoal e também que
solicita princípios técnicos. Este material pode ir para a cena como estímulo
em diferentes níveis.
Conclusões
Mesmo
ciente de que esta investigação tem mais o que gerar além do que foi trazido à
tona neste um ano de pesquisa, ela se conclui sem serem desconsideradas as
poucas elucidações obtidas. Muita coisa foi lida, tem-se bastante material em
forma de fichamento e anotações. Isto que se recolheu comprova que existe uma
serie de possibilidades de utilização dos sonhos como subsídio para a criação
cênica. Por outro lado, também fica claro que para colher daí, resultados
teóricos e práticos mais relevantes seria preciso mais tempo de estudo.
Agradecimentos
Agradeço
ao Prof. Dr. Aguinaldo Moreira de Souza e a Cia.L2 pela rotina de pesquisa que
partilhamos diariamente.
Referências
FERNANDES, C. C. Surrealismo
& Loucura e outros ensaios. São Luís: Gráfica Aquarela, 2008.
REBOUÇAS, M. de
V. Surrealismo. São Paulo: Ática, 1986.
TOPORKOV, V.
Tartufo: Charla preliminar y comienzo de los trabajos praticos. In: TOPORKOV,
Vasily. Stanislavsky dirige. Argentina: Faberman, 1961, p.
163-231.