A ORGANICIDADE E A REPRESENTATIVIDADE DO ATOR: EXPERIMENTAÇÕES E REFLEXÕES NO TRABALHO COM AS CORPOREIDADES ANIMAIS
Antonio
Marcelino Vicenti Rodrigues (Fundação Araucária/Inclusão Social ─ UEL), e-mail:
rodrigues_amv@hotmail.com
Orientador:
Aguinaldo Moreira de Souza, e-mail: guidanca@hotmail.com
Universidade
Estadual de Londrina/Centro de Educação, Comunicação e Artes/Departamento de
Música e Teatro/Londrina, PR.
Grande área: Linguística,
Letras e Artes / Área: Artes.
Palavras-chave: organicidade, representatividade, corporeidades
animais.
Resumo
Este
trabalho aborda alguns princípios não interpretativos trabalhados nos
exercícios das corporeidades animais[1]
que podem ser usados para a geração e a manutenção da organicidade do ator no
ato representativo. Isso se dá na tentativa de entender como é possível ao ator
encontrar a organicidade dentro de exercícios codificados, os das corporeidades
animais.
Introdução
A pesquisa aqui apresentada pensa
meios não interpretativos e orgânicos para a composição cênica a partir de
exercícios com as corporeidades animais. Busca-se espaço para a experimentação
e reflexão acerca do fazer teatral pela aplicação de princípios não
interpretativos em relação às corporeidades animais.
Materiais e métodos
As reflexões aqui apresentadas se
deram por meio da prática diária com os exercícios das corporeidades animais e,
simultaneamente a isso, a teorização dos mesmos por meio dos subsídios teóricos
aqui apresentados.
Resultados e Discussão
Da organicidade
De acordo com a definição de Luís O.
Burnier (2009), a organicidade configura-se em um nível primário, como a
organização interna de nossos órgãos para a manutenção do fluxo de vida de
nosso corpo e, em um nível secundário, como a coerência complexa dos elementos
de um sistema, o qual é artificial e estético. Dessa forma, torna-se necessário
à obtenção da organicidade em uma ação física ou em uma sequencia de ações
físicas o desenvolvimento de um conjunto complexo de ligações e interligações
internas à ação ou à sequência das ações. Entenda-se por ação física “um
processo psicofísico de luta contra as circunstâncias dadas para alcançar um
determinado objetivo, que se dá no tempo e no espaço de uma forma teatral
qualquer” (DAGOSTINI apud DAL FORNO, 2002, p. 41).
Stanislávski (apud RUFFINI, 1995) em seu sistema, propõe uma condição essencial
para o ator estar em cena, que consiste na condição humana mais simples e natural. A partir do trabalho, do estudo e
da técnica, Stanislávski aponta que seu sistema tem a finalidade de construir
uma “sensibilidade cênica geral” (STANISLÁVSKI apud RUFFINI, 1995, p. 150), isto é, um nível de aguçamento
psicofísico que não condiz com aquele utilizado na vida cotidiana, o qual, por
sua vez, é mecânico e condicionado. O nível de aguçamento psicofísico que o
sistema stanislavskiano busca, está relacionado com a integralidade do corpo do
ator. O objetivo deste, em seu ofício, deve consistir em buscar a dilatação do
“corpo-mente”, os quais estão intrinsecamente condensados. Franco Ruffini
(1995, p. 150) aponta:
A condição humana de
que fala Stanislávski, baseada em procedimentos ‘psicofisiológicos que se
originam em nossas próprias naturezas’, pode ser definida como o ‘corpo-mente
orgânico’. Aceitando a ‘ficção da dualidade’ podemos dizer que um corpo-mente é
orgânico quando o corpo responde às exigências feitas pela mente de uma maneira
que não é nem ‘redundante’, ‘negligente’, ‘nem incoerente’, isto é, quando:
─ o corpo responde
somente às exigências propostas pela mente;
─ o corpo responde a
todas as exigências propostas pela mente;
─ reagindo a todas as
exigências propostas pela mente, e apenas para esses comandos, o corpo se
adapta a elas, procura satisfazê-las.
A organicidade
corpo-mente revela-se no corpo que não age em vão, que não se esquiva da ação
necessária, que não reage de uma maneira autocontraditória e contraproducente.
Partindo destes princípios, a organicidade
do ator se encontra em um corpo que pulsa psicofisicamente em direção a um
objetivo, o qual, por sua vez, faz com que todas as ações desse corpo sejam
justificadas com conteúdos verdadeiros, tendo suas raízes na interioridade
física e psíquica do artista, as quais agem de forma condensada e simultânea.
Da representatividade
A atuação não interpretativa
viabiliza-se por meio do princípio da equivalência, que consiste em o ator “ter
o mesmo valor e ainda assim ser diferente” (BARBA, 1995, p. 95). De acordo com
Luís O. Burnier (2009), o ator deve representar e não interpretar, pois afirma
que aquele que interpreta, apenas faz a tradução de uma linguagem literária
para a cênica, enquanto o que representa está
no lugar de, assim, “não busca um personagem já existente,
ele constrói um equivalente por meio de suas ações físicas” (BURNIER, 2009, p. 23). O ator que representa age e emite sinais,
e o espectador cria, para determinados sinais, um sentido. Por meio da relação
entre o ator e o espectador há a criação do personagem, assim, “não é o ator
quem está entre o personagem e o espectador, mas, o personagem que está entre o
ator e o espectador” (BURNIER, 2009, p. 22).
O personagem é criado por meio de sinais, é concebido a partir da relação
ator-espectador, nesses aspectos, o teatro configura-se como “o que acontece
entre o espectador e o ator” (GROTOWSKI, 1971, p. 18).
Temos aqui o deslocamento do foco de
criação. Com a atuação não interpretativa, a criação cênica emerge do corpo do
ator e não mais do texto dramático. Transpondo esses princípios para o campo
dos exercícios com as corporeidades animais pode-se afirmar que estas servem
como subsídios para a organicidade (aguçamento psicofísico) e para a
representatividade (ação não interpretativa) do ator.
Conclusões
Partindo dos princípios relacionados à
organicidade e à representatividade do ator, o trabalho das corporeidades animais
pode ser tomado primeiramente por um prisma técnico e posteriormente por um
prisma metafórico, em que é condensada em determinada corporeidade um conjunto
de qualidades mutáveis, tendo como catalisador dessas qualidades uma estrutura
codificada (o aspecto físico e mecânico da corporeidade animal, sua forma). O
objetivo do ator que trabalha com estes exercícios deve consistir em estudar
meios de fundir os aspectos físicos e mecânicos (fisicidade) da corporeidade
animal com suas próprias energias potenciais, as quais são absolutamente
subjetivas.
Nesse sentido, as corporeidades
animais configuram-se como as energias potenciais do ator investidas em uma
forma codificada e pré-estabelecida, as figuras a serem imitadas e
metaforizadas. Sendo fundamental à obtenção da organicidade, a fusão destes dois
aspectos, as energias potenciais do ator com as figuras metafóricas. Tal fusão
é a responsável pela geração de diferentes estados psicofísicos orgânicos, que
estão relacionados a nove corporeidades trabalhadas por Aguinaldo Moreira de
Souza: a Lagarta, o Peixe, a Serpente, o Jacaré, o Sapo, o Felino, o Cavalo, a
Águia e o Macaco.
Agradecimentos
Aos
meus pais e meu irmão.
Aos
professores Dr. Aguinaldo Moreira de Souza e Mª Adriane Maciel Gomes, sem os
quais este trabalho não teria sido concretizado. Muito obrigado por tudo o que
têm me ensinado ao longo desses anos.
À
Fundação Araucária, pelo financiamento desta pesquisa e por viabilizar a
realização de minhas aspirações acadêmicas. Muito obrigado.
Referências
BARBA, E. Equivalência. In:______; SAVARESE, N. (Org.). A arte secreta do ator: Dicionário
de Antropologia Teatral. Campinas: Editora da Unicamp, 1995. p. 95-103.
BURNIER,
L. O. A arte de ator: da técnica a
representação – Elaboração, codificação e sistematização de técnicas corpóreas
e vocais de representação para o ator. Tese de doutorado, Campinas: Editora da
Unicamp, 2009.
DAL
FORNO, A. A organicidade do ator. Dissertação de mestrado, Universidade
Estadual de Campinas, Instituto de artes, Campinas, 2002.
GROTOWSKI, J. Em busca de um teatro pobre.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1971.
RUFFINI, F. “Sistema” de Stanislávski. In: BARBA, E.; SAVARESE, N. (Org.). A arte secreta do ator: Dicionário
de Antropologia Teatral. Campinas: Editora da Unicamp, 1995. p. 150-153.
[1] Os
exercícios com as corporeidades animais fora desenvolvido pelo professor Dr.
Aguinaldo Moreira de Souza e constitui-se de nove figuras a serem imitadas e
metaforizadas: a Lagarta, o Peixe, a Serpente, o Jacaré, o Sapo, o Felino, o
Cavalo, a Águia e o Macaco.
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